terça-feira, 26 de abril de 2011

O DIÁRIO DOS MOMENTOS PERDIDOS (IX)

Lembrava agora o António, com saudade,
esse sentimento que é português e não é de mais ninguém
o momento em que se viu enrolado com a Raquel, rapariga bem torneada e de cabelos compridos, bem feita de peito e de rabo, com uns calções de lycra branca e uma apertada t-shirt. Estava-se no, entretanto desertificado, balneário feminino, após a aula de educação física, local para onde a dita rapariga
moça dada aos relacionamentos ocasionais
havia arrastado o António. O nosso amigo nunca foi muito adepto desses encontros de ocasião, os tempos também eram outros é certo, mas sempre lhe agradou mais a difícil conquista da inocência do que a fácil partilha da luxúria. Visão conservadora esta, talvez hoje em dia seja tudo diversão, mas para o António a busca era mais pelo amor do que apenas pelo sexo. Personagem caricata, talvez não
no entanto agora se compreende o porquê da relevância deste episódio
de qualquer forma, personagem caricata ou não, nunca dá um rapaz adolescente uma resposta negativa a uma oportunidade tão flagrante, afinal que mal é que tem, a miúda era gira, muito gira mesmo, está bem que já alguns amigos haviam descrito grandes habilidades sexuais com ela, mas o rapaz tinha protecção, era precavido, e estava cheio de vontade de fazer aquilo que nunca antes havia experimentado.
Não se pode dizer que a importância deste acontecimento esteja directamente relacionada com a grande duração do mesmo. Para sermos honestos e sinceros, a duração não foi muita. A intensidade, essa sim, para o António foi impressionante, mesmo inacreditável. Para a Raquel, pelos esgares eróticos que produziu, grande barulheira ela fez, pareceu ser também grande a intensidade do acontecimento, subentende-se que ou era boa actriz ou então era mulher de orgasmo fácil. Facto indiferente para o António, porque se a mulher resolve fingir o problema é mesmo só dela, não que ao António não importasse satisfazer a Raquel, afinal que bela dádiva ela lhe tinha dado ao desvirginá-lo mas, dizíamos, se a rapariga resolveu fingir, o problema é mesmo só dela porque toda a gente sabe que se uma mulher parece satisfeita a única coisa que com isso diz ao homem é que sim senhor, és um garanhão, fizeste tudo bem, e o pobre coitado, enganado na sua competência, convicto da sua qualidade, não vê mesmo razões nenhumas para mudar nada
em equipa que ganha não se mexe
e quem vai continuar a ficar insatisfeita é mesmo a mulher. Isto se houver segundas núpcias e o certo é que houve, segundas, terceiras, quartas e muitas mais, durou muitos meses e foi precisamente com a Raquel que o António se iniciou nas artes do amor. Talvez seja um cliché falarmos de artes do amor mas a verdade é que é isso que faz sentido porque tudo aquilo que na vida é bonito, único e irreproduzível só pode mesmo ser considerado uma arte.
Não saberemos aqui dizer se foi uma profunda paixão aquilo que o António sentia pela Raquel. Talvez não fosse. No entanto, quando se é adolescente, dos adolescentes mais velhos, aqueles que acham que já sabem tudo, descobrir de repente que se gosta de alguém não dá azo a grandes questões sobre o que é o amor
essas ficam para mais tarde
aquilo que interessava mesmo era que gostavam os dois um do outro e se sentiam bem partilhando aquilo que de mais íntimo há, ou seja, a intimidade do nu, do toque e da carícia. Sejamos, também, honestos para com a rapariga porque não era actriz nenhuma, simplesmente gostava de sexo, gostava do António
não forçosamente por esta ordem de preferências
e muitas e muitas coisas lhe ensinou, daqueles ensinamentos que não se falam, apenas se transmitem, só se sentem, daqueles ensinamentos que parece que vêm de dentro de nós, coisas que mesmo ainda não sabendo parece que afinal já sabíamos. Foi, por tudo isto, com tristeza que o António viu a Raquel mudar de escola
o pai foi transferido
e dela nunca mais o António ouviu falar. Não admira, portanto, que, olhando para trás, para a vida que agora acabava, a Raquel juntamente com a sua boa disposição fosse um peso importante no tal balanço, fundamental mesmo, uma recordação agradável e um acontecimento de grande dimensão que ficaria para sempre na peneira da memória, lembrança de grande felicidade e também marca de alguma tristeza porque da primeira vez nunca se esquece e o António tinha pena da forma abrupta como as coisas tinham acabado. Enfim, assim é a viagem do amor, feliz na partida e triste na chegada.
(Cont.)

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