sábado, 6 de março de 2010

O PÂNTANO, O APARELHO E O SISTEMA


Há muito boa gente no PSD que não gosta de Cavaco Silva. Não quer sequer a sua reeleição. Se isto, à primeira vista, pode parecer uma idiotice primária não deixa de merecer uma reflexão um pouco mais profunda:

1. Quem pensa dessa forma é, normalmente, parte integrante do aparelho do PSD;

2. Quem pensa dessa forma é, normalmente, membro (e vive do) aparelho de estado.

3. Quem pensa dessa forma é, normalmente, apoiante de Pedro Passos Coelho;

Daqui não se pode concluir nem que todos os apoiantes de PPC são assim (porque não são), nem que todos os "aparelhistas" são assim (porque não são) nem, também, que todos os apoiantes de PPC, aparelhistas e trabalhadores do aparelho de estado serão assim. Da mesma forma, nem todos os que pensam assim se enquadram nestas três categorias.

No entanto, pode concluir-se que há uma certa cultura política de interesse partidário, o célebre discurso da união em torno do "temos de chegar ao poder porque o PSD é a solução para o país apesar de não explicar porquê" que não gosta de Cavaco. E não gosta de Cavaco por dois motivos: (1) Ele não é um deles, não partilha a mesma identidade nem o mesmo discurso. (2) Cavaco se tiver de prejudicar o PSD em nome de Portugal não hesitará, o que significa prejudicá-los a eles porque eles se identificam com o PSD.

Para estes militantes o PSD é a sua vida. Dia a dia entram nas sedes que limpam com afinco, entram nos gabinetes de vereação e assessoria onde passam doze a catorze horas do seu dia "dando o litro" pelo seu partido e pelo seu país. E, muito importante, do seu poder no PSD vem o tal emprego no aparelho de estado que lhes dá o importantíssimo salário no fim do mês com o qual pagam as suas contas. Não são maus. Mas não vêem, na sua maioria, o filme em todo o seu esplendor. Não pensam o país, porque não têm tempo, não podem ou não conseguem; nem estudam, imaginam ou aprendem as diferentes soluções para o futuro com a profundidade que a importância dessas questões exigiria. E muitos, mais tarde ou mais cedo, perdem-se nas malhas do interesse pessoal e partidário. Como pode alguém arriscar tudo o que tem, até a sua identidade, arriscar aquilo que se é, em nome de uma candidatura que fosse mais do interesse nacional quando eles se identificam com o interesse nacional, um princípio do qual compreendem o conceito mas, turvados pelas malhas do sistema, não inferem a sua aplicação prática? Como pode alguém aceitar que a sua identidade faz parte do problema e não da solução?

Aparelho haverá em todas as candidaturas. Interesses internos também. Mas não tenho dúvidas que onde mais independência há é com Paulo Rangel. E em Cavaco. E é por isso que tantos e tantos, mais do que defender a sua dama, passam a vida a bater nestes dois. Porque não são "dos deles". Não são como eles. Já a candidatura de Passos Coelho corporiza esta identidade.

Mas a questão é: numa altura como esta quem é que nós lá queremos a decidir por nós? Esta identidade aparelhista ou a independência em relação ao sistema? O que será melhor para o país?

O problema é que os aparelhos dos dois (e já nem apenas dos dois) maiores partidos se misturam no aparelho de estado. E, apesar de pertencerem a partidos diferentes, partilham uma mesma identidade. E muitas vezes o mesmo interesse. E assim nasce o sistema. Os negócios obscuros, a outra face, a suja e porca face do regime. A face do regime que nos empurra para baixo, que nos enfia nesta never ending crisis que nos assola, nos desgasta e nos deprime.

É esse pântano que tem de ser atacado. Limpo. Destruído. E isto faz-se com leis, faz-se com opções governativas e educativas; faz-se com muitas coisas. Mas só se começa com agentes de mudança fora do sistema. E é por essa razão que homens como Cavaco e Rangel são tão importantes.

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