sexta-feira, 6 de maio de 2011
quinta-feira, 5 de maio de 2011
ALÍVIO
Admito que, apesar da vergonha e da humilhação, a entrada dos estrangeiros no país ofereceu-me um alívio imenso: a noção de que os maníacos, alucinados e aldrabões que nos governam já não podem fazer tudo. Venha a civilizada Europa que a nação Portuguesa segue dentro de momentos quando ajustarmos contas com o bando de ladrões que escancarou as portas do nosso venerando castelo.
DA COMUNIDADE
A minha vizinha, octogenária convicta, tem por costume - que a princípio estranhei - comentar comigo a chegada da conta da água, da luz ou do gás. Diz-me ela que "tenha atenção que já chegou a conta", não vá eu esquecer-me de a pagar. Num desses moderníssimos e mui distintos prédios pejados de pessoas novas e modernas tal coisa seria impossível: é que antes - por oposição a hoje - vivia-se em comunidade, partilhando-se a vida e os seus pequenos e grandes acontecimentos. O individualismo excelso é uma novidade, essa sim moderna, e que, temo, quando passar, deixando finalmente vísivel o seu rastro de destruição impiedosa, não deixará saudade alguma, apenas remorso, pobreza e infelicidade. Gosto muito da minha vizinha.
COMO O CENTRALISMO ORGANIZACIONAL LEVA À DÍVIDA
"O que o cidadão deixa de fazer por si fá-lo o estado por meio dum organismo novo, porque a sua força e complexidade estão na razão da força e do desenvolvimento da esfera de acção de cada cidadão. Ora a força do estado não pode existir senão organizada; isto é, não existe sem repartições e sem empregados, repartições tanto mais complicadas quanto mais perfeita é a organização, empregados tanto mais remunerados quanto são mais importantes os negócios de que se ocupam. O funcionalismo é pois o triunfo da centralização, a sua expressão mais completa, e pode sem ironia dizer-se que uma nação centralizada não chega à sua plenitude, não é, por conseguinte, perfeita, enquanto uma metade dos cidadãos não estiver constantemente ocupada em vigiar, governar e corrigir a outra metade... Mas toda essa gente vive: vive, absorve... e não produz. A ruína das nações centralizadas começa por aqui. Não há relação entre o que sai do trabalho e o que exige o consumo. Para acudir às necessidades do dia é preciso hipotecar o futuro. Mas o futuro há uma hora em que chega a ser presente, e nessa hora aparece por tal forma enfraquecido e sobrecarregado, que já para viver precisa pedir a um outro futuro mais longínquo o dobro e o triplo do que lhe tinham pedido a ele. Eis a progressão terrível da dívida pública! Progressivamente, não proporcionalmente, crescem as exigências do estado: e progressivamente, não proporcionalmente, diminuem os recursos do país, onerado, comprometido numa razão matematicamente assustadora. É neste momento que o fisco, até ali simples organismo como os outros, se desmascara e deixa ver o monstro cruel, tirânico e disforme que é realmente. Nesse momento de brutal fraqueza, toda a política se resume numa única palavra: dinheiro!"
Antero de Quental, Portugal Perante a Revolução de Espanha (1868)
Antero de Quental, Portugal Perante a Revolução de Espanha (1868)
terça-feira, 3 de maio de 2011
A GÉNESE (II)
"O «liberalismo», embora lentamente, criou uma nova ordem política e jurídica e uma nova administração. Mas de «liberal» teve pouco. Por causa da sua intrínseca fraqueza e do seu isolamento na sociedade portuguesa viveu até muito tarde sob a tutela do exército e, depois, sob uma forma de «fusão», ou seja, sob a tutela de partidos sem espécie de legitimidade, que na prática não se distinguiam e governavam por vontade do rei. Na essência um importação (às vezes forçada, às vezes voluntária), o «liberalismo» foi sempre buscar a França e a Espanha ideologias, modelos, métodos de acção e até programas. Nisto não se distinguiu da natureza imitativa da cultura letrada nacional.
Infelizmente, continuou também as tradições do «antigo regime». Um Estado que fez mais centralizado, despótico e intrusivo; a tendência para sustentar com dinheiro público uma classe média burocrática e «parasitária»; e uma constante intervenção na economia, em parte imposta pela ausência de capital privado, em parte por simples penúria financeira. Isto trouxe, como trouxera no fim do antigo regime, um défice permanente e uma dívida nacional sem proporção com pobreza e a dimensão do país."
Vasco Pulido Valente, 'O Liberalismo Português' in Portugal: Ensaios de História e de Política
Infelizmente, continuou também as tradições do «antigo regime». Um Estado que fez mais centralizado, despótico e intrusivo; a tendência para sustentar com dinheiro público uma classe média burocrática e «parasitária»; e uma constante intervenção na economia, em parte imposta pela ausência de capital privado, em parte por simples penúria financeira. Isto trouxe, como trouxera no fim do antigo regime, um défice permanente e uma dívida nacional sem proporção com pobreza e a dimensão do país."
Vasco Pulido Valente, 'O Liberalismo Português' in Portugal: Ensaios de História e de Política
A GÉNESE
"O «liberalismo» fora imposto por um exército (na origem, meio mercenário), pela banca inglesa, e, secundariamente, pela francesa, pelo apoio das Potências e por um príncipe mais brasileiro do que português. Fora das cidades (no fundo, de Lisboa e do Porto), ninguém o pedira e ninguém o percebia.
(...) No meio do tumulto, o «liberalismo», que não ignorava a sua fraqueza, tentou chegar a uma unidade que lhe permitisse governar o país. Sem resultado. Em 24 de Setembro de 1834, D. Pedro, o único «liberal» teoricamente acima das facções, morreu com uma encenação melodramática ao gosto da época. Ea partilha dos despojos consumou as velhas divisões do «movimento». A substância dos bens nacionais, à volta de 87 por cento vendida por «papel» (ou seja, por títulos da dívida pública ou por títulos da dívida do Estado a servidores, que D. Miguel demitira ou que se haviam juntado à causa da rainha na emigração ou na guerra) e muito abaixo do seu valor real, acabou nas mãos de três centenas de privilegiados. O resto ficou para alguns milhares de pequenos proprietários, que comparavam mais caro e quase sempre metálico. Numa palavra, os chefes do «liberalismo» inauguravam o seu reino com a fraude e o arbítrio para se enriquecer a si mesmos."
Vasco Pulido Valente, 'O Liberalismo Português' in Portugal: Ensaios de História e Política
(...) No meio do tumulto, o «liberalismo», que não ignorava a sua fraqueza, tentou chegar a uma unidade que lhe permitisse governar o país. Sem resultado. Em 24 de Setembro de 1834, D. Pedro, o único «liberal» teoricamente acima das facções, morreu com uma encenação melodramática ao gosto da época. Ea partilha dos despojos consumou as velhas divisões do «movimento». A substância dos bens nacionais, à volta de 87 por cento vendida por «papel» (ou seja, por títulos da dívida pública ou por títulos da dívida do Estado a servidores, que D. Miguel demitira ou que se haviam juntado à causa da rainha na emigração ou na guerra) e muito abaixo do seu valor real, acabou nas mãos de três centenas de privilegiados. O resto ficou para alguns milhares de pequenos proprietários, que comparavam mais caro e quase sempre metálico. Numa palavra, os chefes do «liberalismo» inauguravam o seu reino com a fraude e o arbítrio para se enriquecer a si mesmos."
Vasco Pulido Valente, 'O Liberalismo Português' in Portugal: Ensaios de História e Política
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