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quarta-feira, 25 de setembro de 2013

NO EXÍLIO

Longe das trombas dos caciques locais que precisam, pedem, suplicam ou, pior, exigem os nossos votos, vou até Bailly para ler o meu livro em paz, enquanto bebo uma (ou duas) tripel karmeliet. É uma estranha - e triste - sensação de alívio, esta que me assalta ao ver-me longe da claustrofóbica mediocridade política, mediática e burocrática tuga.

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

A CIDADE E OS CAMPOS

De regresso à metrópole apetece-me comentar: na cidade, essa bolha que nos separa do mundo de predadores e caçados, tudo gira a uma enorme velocidade. Aí, na cidade, a única constante das nossas vidas somos de facto nós próprios: tudo o resto muda num constante fluxo de eterna (ilusória, é certo) mudança. Mas no campo, imersos no mundo verdadeiro, aí, a estória é outra: parados, debaixo de um chaparro ou em cima de um monte, deparamo-nos com um cenário que não muda, um cenário que é constante. E aí, na presença do imutável mundo que nos engole compreendemos que quem varia, que quem representa o movimento e a mudança, somos afinal nós. O contraste não poderia ser maior: na cidade, sendo nós a constante, agarramo-nos ao certo, ou seja a nós próprios: daí o individualismo, o egoísmo, a obsessão com o corpo que não muda, que não envelheça, etc. Já no campo, compreendendo que o fluxo imemorial que manda no mundo somos também, e principalmente, nós, então, sendo outra a constante, mergulhamos nela - no mundo - em busca de uma certeza que é forçosamente exterior (e muito maior!) do que nós. É, por esta razão, outro mundo em que se vive: a comunidade ganha um peso que no egoísticamente individualizado mundo das mecânicas cidades nunca poderia ter. A ligação ao mundo, aos ciclos das noites e dos dias, das Primaveras e dos Verões, ganha uma força que nos transcende e nos inspira. Enquanto isso, na cidade, dentro de um centro comercial, nem se sabe se faz sol ou lua. Aí, as luzes eléctricas escondem a via láctea e as estrelas às quais pertencemos. No campo, vive-se e morre-se ao ritmo do mundo; na cidade, as crianças mimadas irritam-se por haver falta de morangos no Inverno.

THE HANGOVER

"A large constituent of a hangover, after all, is a sense of guilt which does not seem to be guilt for anything in particular."

Herbert Mccabe, On Aquinas (2008)

terça-feira, 9 de julho de 2013

O MITO DA CONDENAÇÃO

Sísifo foi condenado, para sempre, a empurrar a pedra até ao cimo da montanha apenas para a ver rebolar de novo encosta abaixo. Foi condenado, atente-se. No entanto, eu permito-me duvidar desta condenação: se não fosse o acto de empurrar a pedra o que restaria a Sísifo que fosse capaz de o entreter? Por outras palavras: o que justificaria a sua existência? Podemos ver a pedra como uma condenação mas também podemos vê-la como a limitação que nos confere a existência: cada um tem a sua.

O PREÇO

Heraclito explicava que a nossa existência se separava da harmonia universal pela tensão entre opostos, uma espécie de limitação subjectiva em relação ao todo. É uma ideia importante: se estamos vivos, então estamos contidos - limitados - numa tensão permanente, numa espécie de conflito permanente entre antagonismos. Esta é a primeira grande aprendizagem do verdadeiro conservador: não pode haver uma verdadeira solução que traga a paz e a harmonia - a perfeição - pois a nossa condição humana não o permite: a harmonia é no plano do todo: o divino, portanto. A nossa limitação comprova-se com facilidade: a vida tem valor porque morremos; e o preço que pagamos por viver é a angústia da morte. Da mesma forma, a insatisfação permanente é o preço que pagamos por termos coisas com que nos satisfazemos. Não há almoços grátis.

sábado, 25 de maio de 2013

DO OPTIMISMO

Se se quer ter uma boa demonstração do intrínseco optimismo decorrente de uma quase inabalável crença no progresso tecnológico como algo inevitável e rápido basta pensar-se que a Odisseia de Kubrick passa-se em 2001 e a acção de Blade Runner em 2019. Até mesmo o cúmulo do pessimismo - a catástrofe distópica do fim da civilização - de Terminator previa que os computadores acordassem em 1997. Entretanto, em 2013, o vai-e-vem espacial foi descontinuado, o Concorde abatido, os carros não voam, as pessoas ainda comem e bebem (cada vez mais), a CDU continua com 10% dos votos e, imagine-se!, uma revolucionária alternativa ao papel higiénico ainda não apareceu. Futuro? Qual futuro?

domingo, 31 de março de 2013

DECRETO HORÁRIO

Costumo jantar às nove horas da noite mas hoje, sem me aperceber, jantei às dez. É apenas natural: os hábitos e o corpo - bem como os homens - não se mudam por decretos governamentais.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

MAMÍFEROS E METEORITOS

Acabou de passar um meteorito enorme e espectacular em plena combustão sobre Leuven: a cauda era brilhante e, ardente, explodiu duas vezes nuns coices cósmicos, aumentando a luminosidade do rasto até que a sua trajectória saiu do meu alcance. Espero que não tenha ido cair em cima de ninguém. Já ontem foi uma espécie de goaxinim todo preto a saltitar mesmo à frente dos meus olhos, à porta de minha casa. Ia ao lixo, o esperto. São sinais, diriam os supersticiosos. São sinais seguramente, digo eu: são sinais de que mesmo na cidade e num país atulhado de gente ainda sobra espaço e tempo para o mundo. E de outra forma não poderia ser: o mundo é grande (e nós pequenos) demais para que fosse de outra forma.

A BOLHA

A ultra tecnologia contemporânea, por ser incompreensível o seu funcionamento ao comum dos mortais, acaba por se transformar numa espécie de mundo mágico onde os homens flutuam sem compreender bem como ou porquê. No entanto, é uma magia aparente e artificial; falsa, portanto: por detrás do palco de pixeis estão os mestres de marionetas que criam de facto a magia em que nos deixamos envolver. Desta artificialidade sobra uma bolha que, através do encanto, separa os homens da Natureza e, por conseguinte, do verdadeiro mistério da vida. Alienados do nosso lugar no Cosmos - que pela sua vastidão nos causa o sentimento da solidão - restringimo-nos àquele mundo que criámos para nós: nele nos deliciamos com o esplendor da descoberta constante do novo sem, no entanto, sairmos verdadeiramente do mesmo lugar: como hamsters numa roda rumamos a lado nenhum pois não saímos da ilusão que construimos para nós próprios. Ao mesmo tempo, separados do nosso devido lugar no Cosmos, alienados do mundo real, sobra-nos uma terrível e constante insatisfação pois nunca a verdadeira completude pode vir de nos encolhermos protegidos - separados! - do mundo. Pelo contrário: virados para dentro, perdemos a infinitude do horizonte que poderíamos, de outro modo, alcançar. Da grandeza passamos à mediocridade, da conquista à imobilidade e da liberdade à escravidão.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A (VERDADEIRA) CIVILIZAÇÃO \ Um grito da Bélgica

Enquanto no sul da Europa se criavam civilizações avançadíssimas que desbravavam os mistérios do mundo ao mesmo tempo que viviam as suas vidas rumo a um ideal de felicidade humana no qual os prazeres gastronómicos - e o vinho! - tinham lugar primordial, enquanto isso, os bárbaros do norte da Europa urravam e decoravam-se com ossos e chifres nas cabeças ao mesmo tempo que chafurdavam nos lamaçais invernosos em que pastavam. Hoje, na Europa, querem que sejamos todos bárbaros: até o bacalhau, essa divindade marítima que apenas os ignorantes não sabem salgar, até o bacalhau, querem barbarizar. E, para cúmulo, acham-se os maiores. Acham que sabem. Talvez esteja na hora de perceberem que certezas não as há, que verdades só no campo da fé e que a vida - a vida feliz! - precisa de um pouco mais de apreciação do percurso do que meramente viver obcecado com os fins. Isto, os bárbaros não percebem; e isto tenho eu medo que nós, Portugueses, sábios da vida milenar, fruto desta barbaridade em que se tornou a vida contemporânea, nos venhamos a esquecer. Hoje, para o jantar, um tinto Alentejano; porque as zurrapas que esta gente bebe - e não exagero! - nem para limpar os pés. Para comer? Ainda não sei. Mas mete azeite bem lusitano, alhos e coentros; porque o que esta gente para aqui enfia pela boca abaixo nem um cão lusíada esfomeado lhe tocava. E o azeite deles? Nem para olear portas. Bárbaros loucos! Não foi à toa que Ulisses se deu ao trabalho de ir tão longe fundar Lisboa: a verdade é que Portugal é a salvação da civilização. A última esperança!, pois que para além de Olivença, civilização é coisa que já há muito que não há; e foi precisamente por isso que nos idos de quatrocentos, cheios de génio, optámos pelo mar. E enquanto o mar existir e nele ecoarem imemoriais murmúrios em português; enquanto as amendoeiras de Trás-os Montes florirem e as ondas banharem esse imenso Alentejo; e enquanto o Pantagruel, nem que passado de mão em mão, for lido pelas novas gerações, cá haveremos de continuar. Hão-de ir à vida os bárbaros (que não a viveram) e Portugal sobreviverá. Para isso, rogo aos deuses: que não nos esqueçamos!; que nos lembremos do que somos! E sobra, finalmente, no fundo bem português, uma secreta e serena tranquilidade: enquanto houver ventos e mares a vida vai continuar.

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

NOÇÕES PANTEÍSTAS (VI)

Santo Agostinho defendia a ideia de que, de alguma forma, nós merecemos o 'mal'; Leibniz argumentava de que o 'mal metafísico' é uma mera consequência da nossa limitação. Ambos estão certos: se entendermos o todo como eterno, temos forçosamente que o conceber também como harmonioso: onde não há tempo, não há acção; onde não há divisões, não pode haver tensões. Ora, a limitação, já dizia Heraclito, exerce-se precisamente pela oposição: a tensão entre os opostos configura a separação entre o finito (em tensão) e o infinito (o absoluto harmónico). O 'mal' apenas pode surgir da tensão: no eterno e absoluto não pode existir nem 'bem' nem 'mal' pois tudo simplesmente é em absoluta harmonia. Assim sendo, o 'mal' será certamente consequência da limitação; mas porque é também a essa limitação que devemos a nossa possibilidade de existência então temos que aceitar que o 'mal' é o preço que pagamos pela vida. Nesse sentido, a existência do 'mal', tendo como alternativa a não-existência, será justamente merecida: não há almoços grátis.

NOÇÕES PANTEÍSTAS (V)

"I tried once to make Spinoza's system intelligible - to show that all things are mere accidents of a single substance. My friend interrupted me and said, 'but my God! Aren't you and I different men and do we not each possess an existence of our own?' 'Close the shutters!' I called to reply to his objection. This strange expression astonished him. He did not know what I meant. Finally, I explained myself. 'See', I said, 'the sun shines through the windows. The square window gives you a square reflection and the round window gives you a round reflection. Are they on that account different things and not one and the same sunshine?' "

Solomon Maimon, Lebengeschichte (1793)

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

NOÇÕES PANTEÍSTAS (IV)

1) O que é eterno, é.

2) O passado já não é e o futuro ainda não é.

3) O eterno, porque é, não é no futuro nem no passado.


Logo, o eterno é no presente.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

O MARATONISTA

A grande vantagem de se correr na rua em vez da hamsterização da passadeira do ginásio é que as pessoas por quem passo, a bufar e a arfar, a passo de caracol e encarnado que nem um tomate, não podem imaginar que acabei de sair da porta de casa não há sequer três minutos.

NOÇÕES PANTEÍSTAS (III)

1) A minha vida são memórias.

2) O passado já não existe.

3) As memórias, porque são passado, são ilusões.

Logo, a minha vida é uma ilusão.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

NOÇÕES PANTEÍSTAS (II)

1) O que é eterno, é.

2) O passado já não é e o futuro ainda não é.

3) A eternidade, porque é, não tem nem presente nem passado.

4) O que é, porque não tem passado nem futuro, eterno é.

5) Eu sou.

Logo, Eu sou eterno.

NOÇÕES PANTEÍSTAS

1) O que é não pode não ser logo a sermos alguma coisa só poderemos ser dentro daquilo que é.

2) O passado já não é tal como o futuro ainda não é.

Logo, somos tudo aquilo de que não nos lembramos e que ainda não sonhamos.

sábado, 5 de janeiro de 2013

INFANTILIDADE

Considerando isto torna-se evidente que o maior problema da sociedade contemporânea é a sua imaturidade: é óbvio que, no mimo da riqueza, na acomodação da ausência de necessidade e na ilusão do fim da história, perdemos o maior ensinamento que a História nos dá: a única solução é aquela que afirma não haver solução. Tudo o resto são utopias de adolescentes mimados que na crença infundada de mudar o mundo - e o Homem - vão acabar a destruir a riqueza do berço da mais bem sucedida civilização da História da Humanidade.

OS ADOLESCENTES

Hoje apercebi-me de que a irritação que a generalidade abstracta dos adolescentes me causa é a mesma que o freakshow mediático em que se tornou a sociedade contemporânea: um bando de ignorantes a berrar banalidades uns aos outros arrogantemente convencidos da sua própria infalibilidade na solução do mundo ao mesmo tempo que, na preocupação com a sua própria imagem, umbigo e demais irrelevâncias, tudo o que realmente importa lhes passa perfeitamente ao lado.