quarta-feira, 29 de outubro de 2003

PERSPECTIVAS



por VM





Hoje fiz uma coisa que me acostumei a evitar, fui a um centro comercial, em plena hora de ponta- fim de semana. Não tinha realmente escolha, um amigo faz anos amanhã e eu fui lembrada disso ontem. Resultado: aquela porcaria estava a abarrotar de pessoas encarneiradas num consumo ignorante, todas com o seu Visa em punho, na busca do sentido da vida em pequenas compensações. Mal entrei, preparada para pôr a minha cara de aluada (melhor maneira de se imiscuir na tribo dos consumistas, nem muito alegre, nem muito preocupada...simplesmente ausente, como os manequins das montras), tive uma surpresa... o perfume de alguém visitou-me. Era outra pessoa, obviamente, mas o cheiro era tão familiar. Há coisas que nem filmes nem fotografias nos conseguem duplicar, são essas as coisas que realmente nos fazem falta.

A morte é um conceito que não combina com a sociedade de consumo. Praticamente desde que nascemos estamos cientes dela mas parece que 30 anos a pagar uma casa nos tranquiliza, nos hipnotiza, sei lá... Recentemente dei de caras com a morte, ponto a favor: tratamento de choque p’ra por a vida em perspectiva. O que raio andamos aqui a fazer? A cultura do belo, do jovem, do plástico... Somos cada vez mais falsos tanto individualmente como em sociedade. E quando uma pessoa se depara com a impotência perante a morte parece que os filtros cor-de-rosa nos são retirados dos olhos. A morte não é bela e muito menos jovem. Não há maneira de a contornarmos com falsidade. Toca-nos a todos porque um dia nos toca mesmo. E ingénua, tomei tudo isto pela dinâmica de um jogo de computador. Descobri que do lado de cá não se passa de nível com a chave mágica e pontuação bónus. Os momentos marcantes não resultam em alterações drásticas do interface gráfico. Do lado de cá vive-se ao nanossegundo. Não interessa se começa uma guerra ou se morre alguém. Direita ou esquerda, chuva ou sol, pepsi ou coca-cola?



OS NORMAIS





Normal, adj. Conforme a norma, a regra, o preceito, a lei.; Exemplar.



Quando eu tinha uns quatro anos perguntaram-me o que é que eu gostaria de ser quando fosse grande,

eu quero ser astronauta

tendo sido precisamente nesse dia que eu percebi que isto de crescer (termo agradável para envelhecer) seria uma inevitabilidade. Um dia eu seria grande. E um dia eu teria de fazer mais qualquer coisa para além das coisas que eu fazia no meu dia a dia. Durante o tempo livre brincaria com os meus masters do universo, durante o tempo onde antes tinha de estar na escola, iria dar umas voltas pelo espaço. Porque não?

Já repararam como os miúdos querem sempre ser heróis?

eu quero ser bombeiro

Para eles não há constrangimentos. Não há dificuldades. É vantagem de se sonhar e não se ter de fazer. Se eu quero ser, eu sou. Eu sonho, logo eu existo.

eu quero ser jogador de futebol

Mas há um momento em que deixamos de querer ser essas profissões que aos nossos olhos de criança parecem ser verdadeiramente extraordinárias.

Onde é que nós perdemos a utopia de seguir os nossos desejos? Qual é o momento em que nós trocamos o desejo de sermos heróis por outra coisa qualquer?

Eu não sei muito bem mas acho que tem alguma coisa a haver com a sociedade. Quando nos viramos para os mais velhos e dizemos que queremos ser bombeiros a resposta é invariavelmente “coitadinho, é tão engraçadinho”, ao passo que se dissermos que queremos ser advogados “ai, já é tão responsável e adulto”. Ora, coitadinho versus adulto... A escolha não é difícil para uma criança de dez anos onde, acima de tudo, aquilo que ela quer ser é adulto.

Ser adulto não é um problema. O problema são os adultos que não seguem os seus sonhos, que não fazem o que gostariam de fazer, que algures pelo caminho desistiram. E acreditem que estes são a maioria

eu quero ser empregado de escritório

Como eu dizia antes, acho que tem a haver com a nossa sociedade. A sociedade pressiona cada um dos seus membros a ir num determinado sentido. E isto é bom ou é mau consoante o sentido que é veiculado. Do meu ponto de vista existem várias formas através das quais a sociedade influencia os seus membros:

A primeira tem a haver com aquelas pessoas que querem verdadeiramente ter uma profissão que lhes agrada mas que não apresenta a melhor remuneração ou status social. Por exemplo, todos aqueles que queriam ser polícias, ou bombeiros, ou qualquer outra coisa mas ao invés dão por si numa qualquer universidade a tentar tirar um curso que não gostam porque os pais lhe disseram que se não tirarem um curso superior não são nada. Já viram? Desequilibramos por completo o mercado do trabalho ao retirarmos de determinados sectores uma série de pessoas que por desejarem ter essa profissão seriam, certamente, excelentes profissionais para os mandar para aqueles cursos que todos aqueles que não sabem o que fazer da vida vão tirar. Depois como há uma data de pessoas a tirar esses cursos, a maioria vai para o desemprego e o resto acaba a fazer algo pelo qual não tem especial apreço, vontade ou talento. É um exemplo de como a sociedade pressiona os seu jovens no caminho errado.

Outra forma tem a haver com aquelas pessoas que nunca chegam a descobrir a sua verdadeira vocação. Não sabem. E não têm a oportunidade de descobrir. E a sociedade não lhes dá a resposta que eles verdadeiramente desejam. Por e simplesmente não chegam a ter a hipótese de tentar ser algo extraordinário. Aqui a sociedade influencia porque se demite das suas obrigações. Influencia por omissão.

No entanto a pior forma como a sociedade pode influenciar é ao limitar os sonhos e os anseios dos seus cidadãos. Bem como os seus comportamentos. E aqui entra um conceito sociológico que caracteriza a forma como a sociedade se movimenta: A curva da normalidade.

Por curva da normalidade podemos entender uma linha imaginária onde quem se encontra abaixo dela são aqueles que têm comportamentos tomados pela maioria; quem se encontra acima dela, tem comportamentos que são tomados por poucas pessoas; não são, portanto, normais. São anormais.

A verdadeira questão que permanece é se, de facto, interessa para alguma coisa, no que à sociedade diz respeito, se os seus cidadãos têm comportamentos normais ou não. No meu ponto de vista não. E até digo mais: Se calhar os comportamentos anormais têm muito mais para ensinar que os comportamentos normais. Isto porque os normais nós já conhecemos. Com os anormais ou olhamos e achamos que não têm interesse ou aprendemos qualquer coisa que não sabíamos.

O que é que isto tem de mal então?

A resposta é que a sociedade pelos seus diferentes canais de comunicação com os indivíduos (família, amigos, canais de comunicação social) leva-nos para a noção de que normal é bom e anormal é mau. Quem tem comportamentos que são considerados excêntricos é ostracizado na escola, é castigado pela família e ignorado pelos media a não ser quando este os junta a todos numa espécie de freak show.

A questão que eu gostaria de colocar é a seguinte: Será que as pessoas verdadeiramente extraordinárias serão normais? Seria Van Gogh um ser normal? Leonardo Da Vinci seria uma pessoa normal?

Eu acho que não. E eu acho que essas pessoas é que são os exemplos. É evidente que não estou a dizer que devemos todos sair para a rua a gritar, a puxar os cabelos e a cortar as orelhas. Isso é loucura. O que eu estou a tentar dizer é que muitos dos impulsos que os indivíduos têm são reprimidos pela pressão social. Pela cultura de massas. Pelo facto de que temos de fazer isto porque toda a gente faz. Afinal de contas, aquilo que eu critico é a transformação da espectacular capacidade de diversidade humana na monótona unidade da normalidade. Deixarmos de ser por termos de parecer.

E eu só vejo uma razão para que a curva da normalidade seja assim tão importante. E é. É mesmo. Só com a curva da normalidade é que se ganha a maior dádiva da sociedade moderna: A previsibilidade dos comportamentos.

Como é que as empresas venderiam se não soubessem à partida que a maior parte das pessoas irá querer esse produto. Só se é normal se se tiver esse produto. Logo, eu se o fabricar vou ter sucesso.

Mas isso não é mau. Permite-nos o desenvolvimento e o crescimento. Tudo bem até aqui. O pior é que a curva da normalidade é nivelada por baixo. E o melhor exemplo disto são os órgãos de comunicação social. Estes, há muito que tomaram a opção de transmitir programas que sejam acessíveis a todos para que possam ter muitas audiências, ao invés de transmitirem programas com real interesse como forma de obrigar as pessoas a melhorarem-se. Se não vejamos: A televisão é a máquina mais poderosa do mundo. Pode instruir, difundir, educar e ensinar o conhecimento do mundo, das gerações, dos cientistas e dos poetas. Mas não. Transmite-nos horas de Os malucos do riso ou do Goucha.

A verdade é que estamos a formar uma sociedade de normais. Os maravilhosos instrumentos que temos ao nosso alcance não nos levam a exceder as nossas normais capacidades e a explorar os nossos talentos, ou seja as nossas capacidades anormais. E aqui é que bate o ponto

eu quero ser anormal

se fossemos todos iguais o que seria de nós?

A beleza está na diferença. Está na particularidade. No que é raro e por isso especial. No que não é normal.

eu quero ser herói

Aquilo que eu verdadeiramente desejo é uma sociedade que potencie as diferenças. Uma curva da normalidade puxada por cima. Que não deixe morrer o nosso sonho de sermos heróis, que nos obrigue a compreender as diferenças dos outros e a aprender com elas porque se não for assim

como poderemos nós evoluir?

o nosso processo evolutivo deixa de se dirigir para o futuro, ou seja para o desconhecido, o melhor, o diferente, para se dirigir para o passado, ou seja para o conhecido, o igual, o normal.

Acima de tudo eu quero uma sociedade de pessoas excelentes, logo uma sociedade de anormais.





quinta-feira, 16 de outubro de 2003

9 MESES E UMA VIDA INTEIRA



por VM





Sou mãe.

Dita a sabedoria popular que as mulheres são mais organizadas, especialmente as mães- autênticas máquinas capazes de fazer mil coisas ao mesmo tempo. Olá, sou o Zé Manel das mães, muito prazer! Sim! Eu sou aquela incapaz de sair de casa em menos de hora e meia, que anda pela rua a semear casaquinhos de malha e bonecos de peluche enquanto tenta ver onde pisa no meio das três mil toneladas de coisas que um pequeníssimo ser hoje em dia não prescinde. Não avisam nos folhetos de planeamento familiar mas deviam: se tem menos de 1m e 60 e/ou a força de um periquito anémico não tenha filhos!

Ainda fico surpreendida com as curvas da minha vida. Os filhos são uma viragem na vida dos filhos de outros. Reparei que a minha mãe tinha vida antes de ser minha mãe...só agora, que também sou mãe de alguém. E no entanto, já não concebo qualquer ideia de vida sem a Matilde (também conhecida como o pequeníssimo ser, possuidor de 3 mil toneladas de coisas). Lá está, nem mais! É mesmo uma viragem na vida. Começa na gravidez, a início é apenas um leve despertar...era a mesma...talvez com uns numerozitos a mais de sutiã, o que, no meu pobre caso, nem era mau de todo. Depois veio a velha máxima “gravidez não é doença”, lembrava-me sempre disso, logo pela manhã, enquanto forçava pela garganta as ampolas de magnésio, as vitaminas, o cálcio e mais sei lá o quê, novamente imprescindíveis ao bom desenvolvimento do pequeníssimo ser...e pensar que as índias lá p’rás Amazonias não tomam ampolas de magnésio! Tsss...que barbaridade!! Lê-se por aí nas revistas da especialidade que a gravidez nos transmite um estado de graça emocional, se com isso querem dizer que tão depressa se chora a ver um episódio do Anjo Selvagem como em seguida explodimos porque pela milionésima vez querem pôr-nos a mão na barriga para “sentir o pontapé”, ok...confirma-se. E num dia perfeitamente igual aos outros, pumba, espinha gelada! Mas o que é que eu ando a fazer?!! Meu Deus, vou ser mãe!! Ah pois...a par da barriga descomunal carrega-se também o peso da responsabilidade. Enterramo-nos em livros tipo “10 passos fáceis para a maternidade” ou “A mãe perfeita”...perda de tempo...mas sempre nos dá a sensação de que estamos a fazer algo para controlar a situação...o que será que lêem as índias lá p’rás Amazónias? Na volta, as entranhas de algum bicho menos sortudo... E para provar que a natureza, ao contrário das mães, é perfeita, eis que chega o nono mês. Não se cabe em lado nenhum, é um trabalhão para se calçar sapatos (geralmente uns bons 3 números acima do habitual) e o magnífico “andar-pinguim” parece ser a única forma do nosso corpo se movimentar- regra geral em idas incessantes à casa de banho. Acaba-se logo o medo, medo de ser mãe, medo do parto, o que for... E então chega o dia D e dentro do dia D chega a hora H e dentro da hora H chega o momento exacto, o nanossegundo preciso em que está mais um pequeníssimo ser entre nós e sentimo-nos o instrumento de um milagre divino. É qualquer coisa épica que nos transforma o olhar. Somos todos filhos de alguém, que no seu nanossegundo preciso, se sentiu um instrumento de um milagre divino. O mundo faz sentido assim. Quantos dedos tem? Pergunta estúpida, mas foi a 1ª coisa que disse na presença da Matilde. E tenho muito orgulho de dizer que tem 20!





terça-feira, 14 de outubro de 2003

UMA QUESTÃO DE LIBERDADES





Já pensaram na quantidade de coisas que nós somos e que, muitas vezes, nem sabemos muito bem o que são? Por exemplo, o que é esta coisa, tão apregoada, de sermos livres?

Alguém me sabe explicar, com toda a certeza, precisão e rigor o que é o conceito de liberdade? Em que consiste? Como se manifesta? Como se aplica na prática?

ser livre é a faculdade de uma pessoa poder expressar os seus sentimentos e ideias sem censura

E não me venham com a conversa de que ser livre é a faculdade de uma pessoa poder expressar os seus sentimentos e ideias sem censura porque isso é uma grande tanga. Todos nós, numa ou outra ocasião, já tivemos de esconder os nossos sentimentos ou as nossas ideias. Quem nunca teve de fazer autênticos fretes a aturar conversas indesejadas? Aqueles telefonemas intermináveis? Ou quem nunca teve um professor ou um patrão a quem, por e simplesmente não reconhecíamos a autoridade para nos dar educação ou ordens? Alguma vez nos virámos para essas pessoas e lhes atirámos à cara a verdade daquilo que sentíamos?

Não podíamos. Quer dizer, poder até podíamos mas não o fizemos. É que uma coisa da qual eu posso ter certeza, é que ser livre não é sinónimo de ser idiota.

ser livre é poder fazer da minha vida o que me apetece

Devo vos dizer que a teoria mais ridícula de todas que eu já ouvi é que ser livre é uma pessoa poder fazer da sua vida aquilo que lhe apetece. Ora se isto fosse verdade eu passava as minhas manhãs a navegar na Internet, as tardes no cinema e as noites nos copos com os amigos. Mas não. Ou vão-me dizer que toda a gente vai de sorriso nos lábios para os seus empregos rejubilando de alegria pelo facto de ir contribuir para o produto interno bruto português?

ah, eu adoro o meu trabalho

pois... mas oito horas por dia, cinco dias por semana, com vinte dias de férias por ano, nem que o trabalho fosse escrever textos para os “pensamentos desblogueados”...

mas se eu não trabalhar não tenho dinheiro

Uma coisa eu garanto. Ser livre não é morrer de fome por isso tem de ser outra coisa. Um conceito que me explique porque é que eu sendo livre me tenho de sujeitar a tanta coisa que me desagrada.

ser livre é poder desfrutar dos prazeres da vida

Mentira! Desfrutar dos prazeres da vida dá colesterol, rugas e barriga. Desfrutar dos prazeres da vida é aquilo que se pode fazer mas só um bocadinho. Desfrutar dos prazeres da vida é para quem pode, não é para quem quer.

Pois é. Isto torna-se complicado. Se somos todos livres porque é que temos tantas restrições?

A conclusão é, então, muito simples: Nós não somos livres. Só que não somos livres porque temos a liberdade de escolher não ser livre. A liberdade enquanto conceito é algo de inatingível. É uma ideia, não é uma experiência. Pensa-se mas não se vê. Imagina-se.

A verdade é que o ser humano abdica da liberdade. Abdica porque tem algo em troca. Deixa de ser livre para viver em sociedade porque esta lhe pode dar coisas que ele sozinho não conseguiria obter.

E aqui reside a questão principal. É um contracto. Todo o ser humano à nascença, sem o saber, faz um contracto com a sociedade humana

eu irei cumprir as vossas regras

absorvendo os nossos princípios e as nossas doutrinas dominantes. Nesse ponto nós não somos livres para escolher. Não temos hipótese. Essa hipótese de escolha, fruto da liberdade inerente à razão humana, aparece-nos mais tarde quando já é tarde de mais. Quando a alternativa é demasiado cara para se pagar. É aí que nos tornamos verdadeiramente adultos, no momento em que aceitamos as regras da sociedade, não por que elas nos sejam impostas

filho tens de fazer o que eu te digo

mas porque simplesmente não estamos dispostos a abdicar de certas coisas que entretanto se tornaram absolutamente fundamentais para nós

aquele carro, aquela casa, aquele electrodoméstico

Na verdade fomos comprados, aceitamos certas regras e certas contingências com as quais, se pensarmos minimamente sobre o mundo que nos rodeia, até poderemos eventualmente discordar

aquela televisão, aquela roupa, aquela playstation

porque, afinal de contas, gostamos do conforto e do comodismo que esta sociedade ocidental nos oferece. “Oferece”. Oferece em troca de algo. Não há almoços grátis.

Então já percebi o que é a liberdade. Liberdade é aquilo que eu não tenho para poder viver em sociedade. Nesta sociedade.

mas não há outra sociedade que crie tanto bem estar quanto a nossa

É verdade. Sem dúvida que o modelo social que a sociedade ocidental apresenta é o melhor e o mais evoluído que alguma vez nós conhecemos.

mas não é perfeito

Tem muitas imperfeições. Tem muito para ser melhorado. Tem muito que evoluir.

Não há nada que me irrite mais do que aquelas pessoas que dizem que, como no filme, “melhor é impossível”. Mais do que isto não há.

Que presunção enorme considerar que um grupo de animais que exploram cerca de quinze por cento da sua capacidade cerebral, partilham 98 por cento de genes com um gorila e que andam por aí há uns curtos milhares de anos já alcançaram o melhor modelo social possível. Isso é mesma coisa do que dizer que no espaço não há mais nada para explorar para além da lua...

Na minha opinião há muito para evoluir. Para mim estamos muito mais próximos do início do que do fim.

E era aqui que eu queria chegar. Ser livre, na verdadeira acepção do conceito, é uma impossibilidade. Mas não podemos deixar de tentar analisar o que é a liberdade do indivíduo enquanto ser social. É efectivamente um contracto. Mas é um contracto que não deve ser imutável. Não deve e não pode. Tudo o que é imutável é contrário à noção de evolução.

Qual é então a definição de liberdade, neste sentido mais restrito? O que é a liberdade do ser humano social?

E, como tudo na vida, a resposta que penso que é a mais correcta é aquela que é mais curta e mais simples: Liberdade é igual a responsabilidade.

Este pequeno princípio, que me foi ensinado na escola, resume tudo. Agora a questão realmente é de que forma se aplica este pequeno princípio na prática.

A sociedade não é mais do que o conjunto de todos os indivíduos que nela estão inseridos. Ou seja, a sociedade é aquilo que nós quisermos que ela seja.

eu não posso mudar o mundo

Ninguém pode mudar o mundo sozinho. Sozinho. Mas nós não estamos sozinhos.

A maior responsabilidade que a liberdade nos dá é sermos críticos e lutarmos por uma sociedade melhor e mais justa do que aquela que nós temos. Foi assim que se construiu a evolução do Homem. Se assim não fosse ainda estaríamos a mandar bruxas para a fogueira.

E a responsabilidade da evolução social é nossa porque a liberdade social também o é. Só quem não é livre é que não pode decidir o seu futuro.

E o que me irrita é que nós para além de abdicarmos da liberdade em sentido lato e geral, começamos também a abdicar da liberdade em sentido restrito. Começamos a deixar de lado o nosso espírito crítico. Deixamos de acreditar que temos força. Sujeitamo-nos. Desistimos.

porquê?

Porque estamos acomodados. Porque acreditamos que assim é que as coisas são. Porque não há nada a fazer.

A maior liberdade que nós temos ninguém, em lado nenhum, em tempo algum e em circunstância alguma nos pode tirar: A capacidade de sonhar.

E, meus amigos, hoje, as pessoas estão a deixar de sonhar. Sonham com coisas para si próprias mas esquecem-se de sonhar para o colectivo. Somos individualistas. Ou seja voltámos ao início. Voltámos, tal como quando éramos verdadeiramente livres, a preocuparmo-nos apenas com aquilo que nos interessa enquanto indivíduo. O que significa que, além de abdicarmos ( e bem) da nossa liberdade em sentido lato, abdicámos também, pelo caminho, da nossa capacidade de mudar o colectivo. Estamos, portanto, a abdicar de ter um mundo melhor. Estamos a fugir às nossas responsabilidades. Logo, estamos a abdicar da nossa liberdade em sentido restrito.

O facto de termos de ser educados com as pessoas, de respeitarmos as hierarquias, de assumirmos sacrifícios ou de termos de ter cuidado com a nossa saúde atesta os limites da nossa liberdade. E isso é bom.

O facto de desistirmos de participar na construção de um colectivo melhor, de não nos atrevermos a ir para além do que nos dizem que é possível, de só olharmos para o nosso umbigo atesta o fim da nossa liberdade. E isso é mau.





quinta-feira, 9 de outubro de 2003

FELICIDADE SOCRÁTICA





Aqui há uns tempos, andei durante uns tempos muito feliz. Esses tempos, como é próprio do tempo, passaram rápido demais e, tal como numa montanha russa de múltiplos altos e baixos, já não ando tão feliz. Ora porra! Isto chateia-me. E passo a explicar porquê.

Primeiro, que irritante facto da vida é este de que os tempos felizes passam sempre mais rápido que os infelizes? Já repararam, de certeza. Os dias pelos quais ansiamos, que são vividos com a avidez própria do prazer pela vida, esvaem-se em segundos enquanto que aqueles dias cinzentos que quando éramos pequenos só desejávamos que passassem depressa, e só não o fazemos hoje porque o tempo já começa a ser curto, duram semanas. Ora, isto devia ser ao contrário. Mas não é. E nunca há de ser.

E assim, vemo-nos num dilema: Ou se aproveita ao máximo uns segundos ou se desperdiça uma eternidade. Conheço bons exemplos de ambas as situações e, como quase sempre, escolho a virtude socrática do meio termo. Não que fique satisfeito mas o que tem que ser tem, forçosamente, muita força.

Mas, há outra coisa que me irrita ainda mais. É que isto do tempo é uma triste contingência da vida, infelizmente não depende de nós. Agora, alguém me é capaz de explicar porque é que nós, seres humanos, pensantes e bípedes, só percebemos o que temos de bom quando já não o temos? E depois já é tarde demais? E isto já é culpa nossa.

Como eu dizia, aqui há uns tempos andei feliz. Como é que eu hei de explicar? A comida sabia bem, a música era boa, a cama era confortável, o céu era bonito, gostava do gajo do lado de lá do espelho, o meu carro andava bem e até espremer borbulhas era um passatempo agradável... Mas, como tudo na vida, acabou-se. Falta-me o sal, o si, a almofada e a nuvem. O gajo irrita-me, gasto dinheiro demais em gasolina e espremer borbulhas, desculpem lá mas NÃO PODE SER, em circunstância ALGUMA, um passatempo, muito menos um passatempo agradável.

E esta, notória, discrepância no meu modus vivendi serviu para eu acordar, contemplar e tentar compreender o que é isso de ser feliz. E cheguei a uma brilhante conclusão: Não sei. Ou melhor, sei alguma coisa mas não sei tanto quanto gostaria de saber. Sei, por exemplo, tal como a Lili há de saber de certeza, que estar feliz é o contrário de estar infeliz. E também sei que estar infeliz é mau e estar feliz é bom. Sendo assim, será lícito afirmar que todos nós perseguimos a felicidade. A questão é que o fazemos como se esta fosse a bandeira de xadrez da última volta da vida

“e foram felizes para todo o sempre”

devendo, por isso, todo o ser humano correr a toda a brida, esfalfar-se para chegar à meta e depois descansar e ser feliz.

ora, isto normalmente não resulta.

E é isto que está errado. E está errado por duas razões: Primeiro, a felicidade não se alcança, vive-se

se não, pressupõe-se que se é infeliz até a atingir

Segundo, nós não sabemos o percurso da corrida

se aquilo que julgamos saber fosse verdade os ricos eram todos felizes e os pobres infelizes, o que não é, de todo, verdadeiro

Não nos podemos esquecer que a felicidade atinge-se e perde-se todos os dias e várias vezes. Todos dizemos que o dinheiro não traz felicidade mas que ajuda a comprá-la e isso é a maior mentira do mundo. A felicidade move-se de maneiras estranhas demais para ser transaccionada e apanha-nos quando menos esperamos. Ou larga-nos. Nós sabemos (às vezes) quando estamos felizes e, se formos espertos, até sabemos porquê; mas não sabemos quase nunca aquilo que nos vai tornar felizes. Já repararam que as melhores coisas da vida são inesperadas? E que as coisas pelas quais muito ansiámos têm tendência a desiludir?

E é, precisamente desta forma, que cai por terra um dos maiores dogmas humanos. Que nós decidimos o nosso futuro e que escolhemos a nossa própria felicidade. Nós não escolhemos a nossa própria felicidade, na sua plenitude, simplesmente porque não sabemos qual o melhor caminho para a atingir. E se não sabemos qual é o melhor caminho para a atingir, logicamente não devíamos poder decidir o nosso futuro pois quem é que quer escolher um futuro onde não seja feliz?

Não. Isto não pode ser. Não faz sentido.

Ou então... Espera lá. Claro!

A verdade, é que a felicidade manifesta-se, tal como tudo na vida, de diversas maneiras, das quais ressalvo apenas duas: A felicidade da vida que se vive e a felicidade da pessoa que se é.

A felicidade a que eu me referia é a da vida. Dos pequenos prazeres. Dos momentos. É instintiva. Sabe bem mas não se sabe bem porquê. É o sentimento de satisfação, de posicionamento no mundo do animal que existe dentro de todos nós. E é verdade: Esta felicidade não se compra. Não se vende. Deseja-se mas não se alcança. Experimenta-se.

A felicidade de que toda a gente fala é diferente. È uma ideia, logo é racional. É o desejo que nós formulamos para nós próprios. É a nossa capacidade de nos reinventarmos, de nos construirmos,

o que é que tu queres ser quando fores grande?

de decidirmos o que queremos ser, alcançá-lo e saboreá-lo.

Mas esta felicidade também não se compra.

No entanto vende-se. Todos os dias são vendidos milhões de euros de felicidade. Mas parece que esta se esvai pelos buracos do carrinho de compras antes de chegar ao carro.

E isso irrita-me. Irrita-me só conseguir definir o que é a felicidade quando já não a tenho. Irrita-me não saber o que fazer para a ter de volta. Mas acima de tudo, irrita-me haverem uns gajos que conquistam a sua felicidade (ou não?) a venderem às pessoas a ideia de que se tiverem A ou B serão mais felizes.

Uma coisa eu fiquei a saber. Para se ser feliz é preciso ter um pouco das duas felicidades. É preciso gostar da vida e de nós. Uma felicidade sem a outra não é sinónimo de felicidade.

De que me serve ter, ou ser, tudo o que sempre sonhei, se as horas me custam a passar, se estou condenado a viver a tal eternidade de uma vida vazia de momentos.

Por outro lado, até parece interessante o conceito carpe diem de viver o momento de uma forma hedonista. Mas não será isso uma dourada prisão no presente, privando-nos o passado

porque tudo é igual

e o futuro, também

porque não temos objectivos nem sonhos.

A verdade é que a felicidade é a junção destas duas componentes e muito mais. Mas pelo menos destas duas é. Mas, provavelmente, como tudo o que nós não sabemos definir, é muito mais do que nós podemos sonhar.

Mas será que nós temos consciência disto? Será que temos consciência do equilíbrio permanente que deveria existir dentro das nossas vidas? Não será que esquecemos os fins e privilegiamos os meios?

Há uns anos atrás decidiu-se um estereótipo social para se atingir a felicidade. Esse estereótipo englobava (ainda engloba) uma série de produtos que se as pessoas não possuíssem nunca poderiam ser felizes.

Definiram-se, desta forma, os meios para o fim máximo da conquista da felicidade.

O que se passa é que os meios cada vez aumentaram mais, cada vez mais as pessoas se matam para os conseguir, perseguindo uma ideia do que é a felicidade, que não é sua e muitas vezes descobrem (tarde demais) que não é isso que os torna felizes.

Hoje voltámos ao tempo dos faraós. Matamo-nos a acartar pedregulhos, para construir a pirâmide de alguém, na esperança de viver uma segunda vida (reforma) plena de felicidade. A verdade é que quando lá chegamos estamos gastos demais para a gozar.

Mas também temos o inverso. Os contestatários que recusam este modelo e optam por procurar a felicidade no momento. Se todos os momentos da nossa vida forem felizes, temos uma vida feliz. Ou não. Decididamente não. Primeiro porque se fossemos sempre felizes, a monotonia da felicidade faria de nós uns perfeitos infelizes. Segundo porque tal com num jogo de futebol não basta dar toques bonitos com a bola, é preciso marcar golos. E quem vive só no presente nunca marca golos.

Por tudo isto, eu só digo que nem oito nem oitenta. No meio é que está a virtude. Ah, e já agora, não acham que sabemos todos tão pouco sobre a vida para andarmos a dizer uns aos outros quais os melhores caminhos para a felicidade. Até porque aquilo que faz a Lili feliz não é de certeza aquilo que me faz feliz a mim.

Lá está! O método socrático do meio termo... E o da admissão da nossa ignorância.

FOI ESTA A MENSAGEM QUE LHE MANDEI



“ e de repente lembrei-me : o que é feito da rapariga dos meus sonhos? Um grande beijinho para ti...”

Foi esta a mensagem que eu lhe mandei – disse Zeca em voz alta.

Ele estava sozinho em casa, mãe no trabalho, pai no Alentejo

e ela não respondia

Ecoavam pela casa os sons , tristes se sozinho, alegres se acompanhado, de Nat King Cole. Porquê, perguntava-se ele, porque é que ela não reponde? Várias eram as respostas a esta e a outras perguntas. No entanto nenhuma delas o satisfazia. Tinha de haver uma resposta que simultaneamente lhe dissesse que ela, Inês, gostava dele mas que ao mesmo tempo lhe apresentassem uma razão para que o seu telefone não tocasse o som pré-defenido de chegada de mensagem.

Conhecera-a no verão, rapariga altiva e alegre. Companheira de noites divertidas. Juntara-os a mística, própria do verão, as feromonas quentes da juventude que os unia. Ele praticamente a ela se declarara e ela

o meu namorado está em Madrid

não lhe dera hipótese. Todavia, algo de magnético, enigmático, que nem ele nem ela percebiam, talvez algo de poético, lhes dizia que eles deviam estar juntos. Ele acreditou, ela nem por isso. Ele queria mais mas ela não.

o meu namorado está en Madrid

se não fosse o namorado

Que argumento era este, perguntou-se ele mais tarde, que argumento era este que o fazia achar que a instituição do namoro era uma perfeita estupidez

o teu namorado está em Madrid... e depois?!

mas que ao mesmo tempo o fazia pensar

que sorte a dele

eu é que devia ser o teu namorado! E aí já fazia sentido, o namoro, dois humanos unidos pela força do destino. Juntos pelas circunstâncias do verão. Louco verão – pensava ele – Discotecas, noites perdidas, ou ganhas, dependendo da perspectiva, danças, toques, música que soa a violinos mesmo para quem poucas vezes os escutou.

que sorte a dele

E o amor se transforma em ódio – Filho da mãe, com uma miúda destas e vai sozinho para Madrid?

Mas ela foi-se embora. E ele ficou. Sozinho.

O verão continuou, as noites sucederam-se, as bebedeiras, os amigos, as miúdas na praia... Meses passaram

nunca mais a vais ver – disse-lhe o Rui

sem que ele a visse. Pensando bem, ele tinha sido estúpido o suficiente para ter perdido o número de telefone dela

o meu namorado está em Madrid

Ela não queria nada com ele.

Zeca viu os dias passarem e, gradualmente, a foi esquecendo. Volta não volta lembrava-se mas

o meu namorado está em Madrid

E até apareceram novas conquistas mas o seu íntimo sempre lhe dizia que faltava qualquer coisa. – Não tem aquele je ne sais quois, ou então não temos os mesmos interesses. Zeca afundou-se no trabalho e

tão longe que já vai aquele verão

o dia a dia, monótono, recompensador profissionalmente mas vazio das mais profundas emoções, continuava, célere, impiedoso e, sem desculpas, pequenino.

Zeca era um rapaz de vinte e dois anos dedicado às artes. Queria ser actor mas as oportunidades escasseavam. Acima de tudo dedicava-se, porque tinha de viver, a um trabalho de vendedor numa conceituada empresa de telecomunicações. Filho de pais casados, no entanto beligerantes, cedo metera na cabeça que tinha de singrar no mundo por ele próprio. Se o teatro ou cinema dessem alguma coisa tudo bem mas o importante era garantir que tinha alternativas. Andou durante alguns anos na universidade mas era cara e com um horário extenuante não tinha grande motivação. Nunca soube o que queria fazer da vida até perceber que ser actor lhe permitiria ser tudo. Podia ser carpinteiro, astronauta, médico ou, simplesmente, ele próprio. Era, como ele costumava dizer, mais que um dois em um, um infinito em um.

será que tenho jeito?

Mas até tinha. No entanto o emprego não lhe dava tempo e , como tantos outros, Zeca transformou-se numa pequena peça da gigantesca engrenagem da sociedade moderna.

Trabalhava durante a semana, divertia-se ao fim de semana. A vida até não é assim tão má. E a pouco e pouco ele foi crescendo e percebendo que isto de trabalhar, comer, dormir e, já agora que se é jovem, divertir até era um modo de vida. Feliz? Talvez.

Mas chegou aquela noite. Festejava o aniversário com amigos e amigas, uma delas até bastante – talvez de mais – próxima quando a viu

meu Deus!!!

junto a uma coluna da melhor discoteca de Cascais. Loura, olhos castanhos claros, com uma forte inflexão para o esverdeado, esplendorosa com um top e umas calças apertadas. Era ela. Inês.

Conversaram durante mais de uma hora. Lembras-te disto e daquilo, o que fazes agora, etc...

- Então e Madrid? – Perguntou-lhe ele, numa clara alusão ao patife que tinha lá chegado antes dele.

- Ah isso.. ´tou mais numa de independência – respondeu ela com um ar enigmático.

Ele ouviu sinos, catedrais, resmas de sons. E aguentou-se de pé.

- Independência? Temos de combinar ir sair. Talvez um cinema ou até ir ao teatro... – disse ele com um entusiasmo contagiante.

- Claro, vamos combinar – um sorriso grassava naquela cara, clara e bonita.

Naquele momento, Zeca percebeu o porquê daquele misterioso vazio que o acompanhava nos últimos meses.

Passaram-se dois dias e ele telefonou-lhe – agora não tinha cometido o mesmo erro – pensou ele. Mas ela não podia.

Passaram-se mais dois dias e ele voltou-lhe a telefonar. Mas ela estava cansada.

mas que merda é esta?

Dois dias depois – Hoje há um espectáculo de stand up comedy no Bairro Alto – mas ela não quis ir.

- Ora bolas! – disse ele em voz demasiado alta – Será que ...

já não eram sinos que ele ouvia.

Ela tem o meu número.

Passou-se quase uma semana e nada. Ela não lhe ligou e ele poucas ligações telefónicas vendeu.

- O que se passa? – perguntou-lhe Sandro, o seu supervisor.

- ´Tou em baixo de forma – responde-lhe Zeca secamente.

Mas hoje, sozinho em casa, após ter aberto uma garrafa de vinho, Zeca mandou-lhe uma mensagem:

“ e de repente lembrei-me : o que é feito da rapariga dos meus sonhos? Um grande beijinho para ti...”

Mas ela não respondeu. – Ainda – pensou ele – Ainda não respondeu.

A garrafa de vinho acabou – O jantar até estava porreiro – disse ele entre dentes, cada vez mais sonolento. Que se foda a mensagem, eu até nem gosto dela. Vou mas é para a Austrália. Imagens desconexas de australianas de bikini pululavam alegremente, ou tristemente, pela sua mente. – O que não falta por aí são gajas – dissera-lhe uma vez o Rui, enquanto lhe punha a mão no ombro

esse gajo é que tem razão

“ e de repente lembrei-me : o que é feito da rapariga dos meus sonhos? Um grande beijinho para ti...”

Até estava gira a mensagem...- pensou Zeca, enquanto dava um último gole.

Numa espiral de imagens e sentimentos insana que se afunilava cada vez mais no seu íntimo, Zeca, a pouco e pouco adormecia. Mais para lá do que para cá lembrou-se dela. Pelos vistos não queria nada com ele. Porquê? – perguntava-se ele morbidamente. Adormeceu.