quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

SYNCHRONICITY


Daqui.

LIBERDADE INTERIOR

Numa coisa os marxistas acertaram: a luta pela liberdade também reside no interior de cada um de nós. Não na ascensão a um 'eu superior' racional capaz de controlar o 'eu inferior' atolado em paixões e desejos imediatos - isso é uma outra forma de escravidão - mas sim na recusa de viver a vida pelo jugo de terceiros. Viver na ânsia de impressionar os que nos rodeiam ou viver com o receio do "que irão eles pensar" é viver pela opinião dos outros: e viver pela opinião de outrem que não a minha é viver pela vontade de terceiros; a escravidão, portanto.

O ESCRAVO E A LIBERDADE

"A não ser... A não ser que, no caso desses tipos, a perversão hereditária das qualidades naturais vá tão longe que atinja o próprio fundo do temperamento... Sim, que um tipo nasça para escravo, nasça naturalmente escravo, e portanto incapaz de qualquer esforço no sentido de se libertar... Mas nesse caso..., nesse caso..., que tem ele que ver com a sociedade livre, ou com a liberdade?... Se um homem nasceu para escravo, a liberdade, sendo contrária à sua índole, será para ele uma tirania."

Fernando Pessoa, O Banqueiro Anarquista, 1922 [Fernando Pessoa, O Banqueiro Anarquista, Assírio & Alvim, 2ªEd, 2007, p. 63]

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

DO ARREBATAMENTO

No mundo novo em que nos despejaram, as relações amorosas fazem-se de coisas "que se precisa", de "tempos" que um ou o outro quer dominar e de "espaços" que a um ou outro fazem falta sem nunca se lembrarem os pseudo-amantes que nas matérias do Amor, do verdadeiro, nada mais conta do que o arrebatamento: e o arrebatamento não conhece coisas ou necessidades nem sequer tempos ou espaços. Tudo o resto é nada.

THE TASTE OF LIFE

Portishead, "We Carry On", Third (2008)

MARQUETISMO: UMA FORMA DE ESCRAVIDÃO

"If the tyrant (or 'hidden persuader') manages to condition his subjects (or customers) into losing their original wishes and embracing ('internalising') the form of life he has invented for them, he will... no doubt have them feel free... But what he has created is the very antithesis of political freedom."

Isaiah Berlin, Two Concepts of Liberty, 1958 [Isaiah Berlin, 'Liberty', Oxford Universit Press, 2005, p. 186]

NA BIBLIOTECA [PORTUGUESA]

Estou sentado, ao frio, a um canto onde consegui finalmente encontrar lugar. Nessa extremidade, a parede faz-se de vidros e portas que dão lugar a salas privadas insonorizadas para, deduzo eu, projectos de investigação ou trabalhos de grupo. A janela, ao meu lado, a todo o comprimento da parede, desnuda, como num aquário, o estudo aplicado de um grupo de indivíduos. A algazarra é tão grande que, apesar da insonorização, é-me difícil concentrar pelo que, incomodado, acabo por demorar-me a observar o que se passa dentro da sala de estudo: um passa música electrónica enquanto abana a cabeça repetidamente ao som da batida; outro, de costas para mim pelo que lhe vejo o ecrã do portátil, entretém-se no Facebook; outro ainda, assobia tentando acompanhar, sem sucesso, o refrão da música, enquanto um mais afoito se levanta e, abrindo a porta para sair, grita em tom de despedida que é para a desbunda. Em seguida, juntam-se em frente de um dos portáteis para uma sessão de Gato Fedorento no Youtube, rindo entre gargalhadas. Não consigo deixar de pensar que deveria de haver uma separação entre zonas de adultos e crianças (de vinte e tal anos) na biblioteca; ou então, um curral para enfiar lá estes zurradores acéfalos. Ainda querem uns quantos impor o direito de voto aos dezasseis anos. Era o que faltava.