Há muito anti-cristianismo por aí. Muito
modernismo que vê os valores cristãos como algo que não faz - ou não deveria fazer - parte da nossa sociedade. Parece-me que há uma importante distinção a fazer entre aquilo que é o
dogma da Igreja (que podemos ver como a verdade, como uma interpretação da verdade ou como uma mentira) e os
valores cristãos. Se a posição que tomamos perante o dogma é eminentemente privada já a segunda é eminentemente pública: o respeito pelo próximo, a tolerância, a noção de comunidade e que a felicidade é partilhada em paz e com respeito pelo Outro são valores de todos, que afectam todos. Posso não ver o dogma da Igreja como a minha verdade mas vejo os valores do Cristianismo como os meus valores. São, aliás, os nossos valores. Porque a Europa se fundou assente no Cristianismo:
"Para agora importa recordar, apenas, que essa Ordem [a Ordem de Cister] presidia, em todo o Mundo Cristão, à organização político-militar, ofensiva e defensiva, contra o mundo muçulmano. Para isso fundou diversas ordens de monges guerreiros, que ràpidamente se espalharam por todos os reinos cristãos, instalando-se junto à Corte dos Monarcas, constituindo o seu estado maior militar, ao passo que, simultaneamente, uma apertada rede de mosteiros fornecia aos Estados cristãos a ajuda intelectual e moral que veio a constituir o núcleo da civilização cristã capaz de apagar os fulgores do progresso islamita. Entre essas Ordens assim creadas, destacaram-se, entre nós, as dos Templários, Santiago, e Avís, verdadeiros potentados militares que, ao serviço de D. Afonso Henriques, estão na base da fundação do reino de Portugal.
Todas essas Ordens, posto que dessiminadas pelo orbe cristão, estavam directamente ligadas à casa-mãe de Cister, em Claraval, por forma que S. Bernardo, suprema autoridade de toda a organização, dirigia seguramente, da solidão da sua cela, não só a ofensiva geral da cristandade, no período da Reconquista, como a política diplomática dos Monarcas obedientes ao Vigário de Cristo na terra".
Costa Brochado, A Conquista de Lisboa aos Mouros, 1952; p. 18 [mantive o Português da época]
É importante compreender que, apesar de muitas lutas motivadas por disputas de poder, muitas cisões e muito sangue, o advento de Europa tolerante, aberta e respeitadora é uma consequência directa da identidade europeia. Os nossos valores só serão europeus na medida em que concordarem com um processo valorativo que une a génese com o momento presente. Somos, por isto mesmo, todos cristãos na nossa identidade, nos valores que partilhamos. A recusa dos valores do cristianismo hoje em dia representa, portanto, uma recusa da nossa origem e daquilo que nos é comum; representa uma tentativa de criação de uma nova identidade. Se é certo que novos valores não serão forçosamente piores - ninguém de bom senso advoga a não-tolerância ou o não-respeito pelo próximo - preocupa-me a erosão do sentido de comunidade. É importante percebermos que os valores do cristianismo não são importantes por serem cristãos:
são importantes porque são nossos. Se esquecermos a nossa identidade comum, como poderemos construir um futuro em conjunto? Este ponto pode parecer menos importante para quem defenda os valores universais modernistas do "somos todos iguais no mundo inteiro" mas representa um problema: os Chineses têm uma cultura própria, os Americanos também e os indianos
idem; ninguém duvida que os Árabes a têm. Se não souber a Europa manter a sua identidade (concorrencial com o resto do mundo) será colonizada. Aos poucos e poucos, pela atomização crescente, o individualismo, o consumismo, a não-identidade valorativa lá vai a Europa definhando, incapaz de manter uma curva de natalidade que assegure o futuro desta civilização milenar. Porque não há uma comunidade que sobreviva sem um entedimento comum sobre os valores que partilha, o ataque aos valores que nos unem (e a recusa de aceitar com orgulho de onde vimos e o que representamos) será apenas mais uma pedra no túmulo do nosso desaparecimento.
Gostei muito deste post, parabéns!
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