segunda-feira, 5 de março de 2007

MELANCOLIA TEMPORAL

Passei meses a desejar que o tempo rapidamente passasse.
Estava farto. Não havia paciência para mais.
Agora o tempo já passou. E a questão é o que foi que ficou.
Na ânsia de viver o futuro, esqueci-me de viver o presente. E quem não vive o presente, pode ter um futuro, mas no futuro não terá certamente um passado.
E é assim.
Estou sem passado. Ou melhor. Tenho o mesmo passado que tinha há meses atrás. Os mesmos problemas. As mesmas virtudes.
E agora?
Agora falta-me aquilo que não tive nestes últimos meses;
A minha mão agarrando lenta e suavemente um riacho,
A fina areia de uma praia solitária,
Uma estrada sem fim,
Uma planície silenciosa,
Falta-me tudo aquilo que não pude ter.
Que vivência esta onde tomar banho num rio não poluído é um acto anual.
Miséria.
Quero fugir desta cidade onde a mesquinhez nos inunda juntamente com o escape negro de um autocarro. Isso não ajuda a viver o presente.
Que sítio este onde as mentes são curtas, feias e pequeninas.
Que sítio este onde somos forçados a assistir ao inusitado festim dos abutres sobre quem não conseguiu ser abutre.
Não há mesmo paciência.
Abutres sem passado.
Passados sem futuro.
Eu tenho um passado.
Tenho um passado forte demais para passar. Não bastam meses. Não basta o tempo.
Eu tenho um futuro.
Não sei onde. Não sei com quem a não ser comigo.
Comigo e com o meu passado.
Não voltarei a desejar que o tempo passe depressa.
Há sorrisos que não se esquecem.
Há sorrisos que não é bom esquecer.
Há sorrisos que é bom ter no passado.
O rio não apaga nada. Aprofunda.
A areia não esconde nada. Revela.
O tempo não passa. Vive-se.

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