sábado, 14 de fevereiro de 2004

A UTOPIA DA PEDRA AMARELA



Eu ás vezes pergunto-me se fazemos a mínima ideia para onde vamos.

Desta pergunta aquilo que primeiro me vem à cabeça é o facto de ela conter a palavra “vamos”. Nós vamos. Nós.

nós, quem?

E esta é que é a grande questão. Saberemos nós que quem vai a algum lado somos nós? Que eu sozinho não vou a lado nenhum?

Nós caminhamos por este planeta, perdido num universo grande demais para se saber sequer onde estamos e acreditamos que a vida se baseia na nossa pessoa sem nos apercebermos que se levarmos em consideração a medida cósmica somos um pequeno micróbio cuja insignificância é, precisamente, a única coisa que poderia significar alguma coisa.

Nós. Nós os humanos.

Um dos sentimentos que me transporta por esta vida é a noção de que somos uma comunidade. Temos os mesmos sentimentos, funcionamos sobre as mesmas leis, temos objectivos comuns e sonhamos com as mesmas coisas.

objectivos

Isto é importante. Temos objectivos comuns. Falamos da nossa subjectividade individual e não nos lembramos que ela só existe porque sobre ela paira o fenómeno, intrinsecamente humano, da objectividade.

Existem, de facto, duas dimensões sociais: Aquela que nos afecta de um ponto de vista individual, a tal subjectividade, e a outra que nos afecta enquanto comunidade, que nos diz respeito a todos, a tal objectividade.

E era sobre isto mesmo que eu gostava de falar. É que algures, na penumbra de um tempo já passado, nos esquecemos que o indivíduo

por melhor que seja

nunca poderá chegar a lado nenhum sem ser acompanhado pela comunidade. Ou melhor só a comunidade é que poderá chegar a algum lado. E por “chegar a algum lado” entenda-se ser melhor, compreender mais e responder a aquelas questões que nos acompanham há tanto tempo. Pelo menos a algumas.

E esta é que é a questão. Há problemas que são de nós todos e nós temos a triste mania de acharmos que se são de todos então não são de ninguém. Mas são. São de alguém. De alguém que não está interessado em os resolver.

Vou-vos falar de um grande problema que poderá vir a afectar a nossa espécie e do qual muito pouca gente ouviu falar e ninguém parece interessado em resolver.

Há cerca de dois anos atrás uma equipa que estudava o ADN humano chegou à conclusão que os seres humanos apresentavam uma estranha falta de diversidade genética considerando a idade da nossa espécie.

Quando os seres vivos se reproduzem o seu ADN evolui mas deixa a marca dos seus progenitores, ou seja, analisando o ADN nós podemos fazer uma espécie de árvore genealógica genética.

Este projecto permitiria ir agrupando os indivíduos em famílias genéticas até que se encontrasse o elo comum. Supostamente esse elo comum deveria ter alguns milhões de anos pois fósseis como a Lucy indicam que os primeiros hominídeos terão aparecido à cerca de 5 milhões de anos.

Quando esse trabalho árduo foi terminado o resultado foi surpreendente: O elo comum existiu há cerca de 75 mil anos.

Quer isto dizer que nessa altura a espécie humana viu-se, de forma drástica e repentina, reduzida a um número muito reduzido de indivíduos

provavelmente na casa dos milhares

fazendo com que todos os seres humanos que existem actualmente descendam todos desses estóicos sobreviventes. Assim se explica a pouca diversidade genética da nossa espécie.

Este estudo apenas lançou uma série de novas questões. Porque teria isto acontecido? Terá sido alguma espécie de cataclismo natural? Um meteorito? Terá sido alguma misteriosa doença? Que acontecimento repentino poderia ter feito desaparecer, num tão curto período de tempo, a maior parte da nossa espécie que, na altura, seria constituída por milhões de indivíduos?

Esses cientistas apontaram claramente para algo repentino e global porque se não fosse global, a evolução genética apresentaria diferenças em diferentes locais, coisa que não acontece; do mesmo modo deverá ter sido repentino porque se não o fosse provavelmente as variedades genéticas extintas teriam tido tempo de se reproduzir.

O que terá, então, acontecido?

Respostas conclusivas serão muito difíceis de obter mas podemos perceber que a nossa pacata existência nunca deverá ser entendida como um dado adquirido. Antes deveremos entendê-la como uma dádiva que devemos preservar a todo o custo e com todas as preocupações.

Paralelamente a este estudo, e sem com ele estar minimamente relacionado, um grupo de geólogos perguntava-se por que razão um lago no Parque Natural de Yellowstone, nos Estados Unidos da América, se parecia estar a mover em direcção a um bosque vizinho. Com a ajuda de uma nova tecnologia desenvolvida pela NASA para o estudo, em profundidade, do planeta Marte, descobriu-se a razão do estranho movimento do lago de Yellowstone. Abismados ficaram quando se aperceberam que por debaixo desse lago existe uma câmara magmática com cerca de 45 km de diâmetro. Ou seja, uma gigante gruta na crosta terrestre que faz com que o magma do manto terrestre suba até próximo da superfície.

Este fenómeno já era conhecido em planetas como Vénus e é apelidado de supervulcão. A câmara magmática vai forçando a crosta até a romper e, nesse momento, é expelido com uma força brutal até que a camada de crosta que por cima dele se encontrava, ficando sem base de sustentação, cede e forma uma gigante caldeira. O lago movia-se porque a crosta terrestre acusa a pressão do magma.

Os cientistas ficaram abismados porque não se sabia que esta espécie de vulcão poderia existir no nosso planeta. Era património de planetas instáveis e onde não há lugar para a existência de vida.

Apelida-se este fenómeno vulcânico de supervulcão porque a quantidade de magma expelido no momento da explosão é infinitamente superior a qualquer vulcão a que tenhamos assistido à sua erupção. Todo o magma é expelido de repente.

Estudando mais atentamente a geologia de Yellowstone os geólogos crêem, considerando o diâmetro da câmara magmática e a quantidade de magma que esta tem capacidade para guardar, que o seu ciclo de erupção será aproximadamente de 600 mil anos. Estudando a fauna e a geologia da superfície calcularam que a sua última erupção terá ocorrido sensivelmente há cerca de 600 mil anos...

Isto quer dizer que a próxima erupção tanto pode ser amanhã como daqui a vinte ou trinta mil anos. Não é, portanto, problema de ninguém...

Mas quais as verdadeiras consequências deste supervulcão? Como nos poderá ele afectar?

Para responder a esta questão os cientistas estado-unidenses usaram a lógica e chegaram à conclusão que se existia um supervulcão, então poderiam existir mais.

O próximo passo desta viagem ao mundo da investigação científica leva-nos até às imediações da Indonésia. Aqui descobriram-se uma série de rochas de elevada dimensão que não deveriam estar no local onde foram encontradas porque não são constituídas por matéria geológica que exista nas imediações das ditas rochas. Elas não poderiam estar ali. Ora como não são obra humana teria de haver alguma de elas serem naturalmente transportadas até ali. Ou melhor expelidas.

A resposta para esta questão é um outro supervulcão que existe a cerca de 100 km das já referidas rochas. Imagine-se a potência da explosão de um supervulcão...

Os cientistas ávidos por respostas apressaram-se a estudar esse novo supervulcão e chegaram a algumas conclusões. A câmara magmática é sensivelmente metade da do supervulcão de Yellowstone e o seu ciclo de erupção rondará os 300 mil anos.

Agora o mais importante é que, analisando a envolvente ambiental do supervulcão da Indonésia, os geólogos chegaram á surpreendente conclusão de que a sua última erupção terá ocorrido entre há 80 e 70 mil anos atrás.

à pois...

Exacto. É isso mesmo. Precisamente um intervalo temporal onde se encaixa perfeitamente a tal marca dos 75 mil anos onde algo repentino, brutal e global terá acontecido e que terá dizimado 90% da população humana de então.

E esta, hein?

Estes dois estudos científicos só foram cruzados porque um dos cientistas de Yellowstone, por fruto do acaso, assistiu à apresentação das conclusões do estudo sobre a diversidade genética. E somou dois e dois. E achou que o resultado era quatro.

Não pretendo alarmar ninguém. A questão é que toda a comunidade humana deveria estar ao corrente de que existem perigos

sejam agora ou daqui a 20 mil anos

que nos poderão alterar radicalmente a forma como levamos a nossa vida.

E o mais importante é que deveríamos estar a estudar como resolver estes problemas ou, pelo menos, minorar as suas consequências.

A Humanidade não está preparada para enfrentar estes desafios. E são desafios de todos nós porque nos afectarão a todos. A nós ou aos nossos netos ou trinetos.

Preparamo-nos para isto custaria muitos milhões. Sinceramente gostaria muito mais de ver os meus impostos a serem aplicados nestas causas verdadeiramente humanitárias

tais como a fome, as doenças como o cancro ou a SIDA

do que assistir impotente a guerras altamente dispendiosas ou projectos milionários que não nos trazem nada de novo.

Sim... Eu sei. Pode ser só daqui a uns milhares de anos.

Mas mesmo assim. Preferia que fossemos explorar o espaço, as novas tecnologias, os transportes do futuro, a genética terapêutica, o funcionamento do cérebro humano, os novos combustíveis e a história do nosso planeta. Preferia o conhecimento, o estudo e a compreensão. Preferia a comunidade objectiva do que as megalomanias subjectivas do indivíduo.

Mas não. Vamos bombardear o Iraque...